De acordo com a Folha de São Paulo, um seminário sobre aborto legal que seria organizado pela DPU (Defensoria Pública da União) aprofundou o desgaste no Senado com a indicação do presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para a chefia do órgão, que está travada há mais de três meses. Igor Roque foi sabatinado e aprovado pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado em julho para o cargo de defensor público-geral federal, mas, desde então, a votação no plenário da Casa vem sendo adiada por causa do risco de derrota.
Segundo a Folha, a paralisia no comando da DPU começou em novembro do ano passado, quando o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro (PL) indicou para recondução o então defensor público-geral Daniel Macedo —que é evangélico. Visto pelo atual comando do Palácio do Planalto como bolsonarista, Macedo teve a indicação retirada e foi substituído por Roque em maio.
Roque não foi questionado sobre aborto por nenhum senador durante as três horas de sabatina na CCJ, mas tem sido associado por parlamentares bolsonaristas à organização do seminário na DPU sobre acesso ao aborto legal, que aconteceria no fim de agosto. A Folha acrescenta que diante da reclamação de políticos, a instituição decidiu cancelar o seminário “para retomar a discussão em evento futuro, a ser organizado com a presença de especialistas com visões antagônicas sobre o tema, tornando o debate mais plural”.
Reservadamente, aliados do indicado por Lula afirmam que o movimento para tentar prejudicá-lo também está sendo patrocinado por defensores públicos conservadores, que temem que medidas adotadas pela última gestão sejam revistas.
A Folha de São Paulo destaca ainda que do outro lado, o cancelamento do seminário acabou provocando desgaste interno para Roque de uma ala mais progressista na instituição —que apoiou sua designação. O painel contaria com a participação da pesquisadora do Instituto de Bioética Anis Gabriela Rondon e da ginecologista Helena Paro, professora da UFU (Universidade Federal de Uberlândia) e responsável pelo primeiro serviço de aborto por telemedicina do país.
Às vésperas da data prevista para o evento, o senador Eduardo Girão (Novo-CE) chegou a subir na tribuna do Senado para dizer que a DPU fazia “apologia ao crime de aborto” —mesmo a interrupção de gestação sendo autorizada no Brasil em casos de estupro, risco à vida da mulher e anencefalia do feto.